sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Primavera de Museus: A Herança Sonora Afro-Brasileira que vem das Torres de Ouro Preto



[...] Porque desde que a gente entende por gente, vê tocar o sino, aí a gente já fica assim: “Está tocando por que?” Toca para uma procissão, toca para um enterro, toca para uma missa. O sino é importante. Para quem é católico o sino é importante, porque está anunciando que está acontecendo alguma coisa. (Efigênia Ferreira/2004)

A linguagem dos Sinos de Minas Gerais, hoje registrada como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro pelo IPHAN, deve, e muito, ao fomento da oralidade perpetuada pelas mãos afrodescendentes desde as Minas oitocentista.  Curt Lange em seu livro: Os Irmãos Músicos da Irmandade de São José dos Homens Pardos de Vila Rica, não deixou de citar o tema no capítulo História da ereção e desenvolvimento da Irmandade de São José. A sua atividade:

A fundição de sinos e o seu içamento também pertencem À história da Música brasileira, e particularmente À das Minas Gerais, outrora região muito perigosa que cerceou milhares de vidas. Naqueles longínquos anos, dos toques das horas Às chamadas para as Missas, Novenas e grandes solenidades religiosas, dos anúncios de morte de um soberano aos toques de fogo ou finados, os sons, ora alegres, ora lúgubres, interferiram com a sua amálgama de vibrações bronzíneas como significativa linguagem na existência dos homens. [1]

Ora, se “a fundição de sinos e o seu içamento fazem parte da história da Música Brasileira e particularmente à das Minas Gerais”, como disse o grande pesquisador LANGE, não faria parte também desta História os sineiros, que seriam os indivíduos que perpetuaram esta prática ao longo de séculos?
Mas quem seriam estes indivíduos? Quem seriam estes sineiros? Estas pessoas que fabricam e dominam códigos emanados das torres convidando os fiéis às atividades religiosas? 
Ora, se os sinos de Minas e suas toneladas eram considerados uma atividade braçal, a quem estaria relegada tal atividade? 
Sabemos que como toda atividade braçal, esta também estaria relegada aos escravos. Estes, assumiam então o ofício de comunicar pelos sinos da igreja. Era parte de suas tarefas: anunciar a vida, a festa, a morte e os ritos católicos. Tarefas funcionais de uma igreja que trazia o sino como potencialidade reverberante. Contudo, estes traços sonoros advindos das torres sineiras tinham nuances muito mais ritmadas que os sons cristãos do continente europeu. E assim, as igrejas de Minas tiveram nas referências tribais africanas os principais códigos para que se convidasse os fiéis para os atos de fé. Fé emanada pelo metal percutido. Percussão executada por mãos que transcendiam a fé europeia, mas que, por outro lado, comungavam com o Divino. E assim, seja na alegria, na dor, no nascimento, no matrimônio, nas procissões ou na morte, os sinos de Minas dobravam e/ou repicavam com sotaques afrodescendentes. Essa prática, mantida viva através da oralidade, ainda avisa a cidade, rotineiramente, acontecimentos religiosos. Para uns repiques excessivos, para outros sons da memória, para tantos a certeza que das torres sineiras, da sempre Vila Rica, emanam sons que sabem aonde querem chegar. Sons que comungam diásporas africanas permeadas de signos: Sino


[1] LANGE, 1968, p. 16.

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